sexta-feira, julho 21, 2006

Quero fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de
verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem
uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática.

Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.

Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se
uma questão
prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade,
ficam
"praticamente" apaixonadas.

Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor
doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de
compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão
embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um
gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de
telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá tudo bem, tudo bem",
tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a
tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um
cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo? O amor é
uma coisa, a vida é outra.

O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o
intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da
tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental".

Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada,
abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e
da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é
para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes.
Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é
para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um
bocadinho de inferno aberto.
O amor é uma coisa, a vida é outra.
A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor
puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor
puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O
amor não se percebe. Não dá para
perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a
nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha,
não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é
necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o
que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor
é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o
coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das
mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é
ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.Não é para
perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e
não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas
mais acompanhado de quem vive feliz.

Não se pode ceder. Não se pode resistir.
A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.
"Elogio ao Amor"
Miguel Esteves Cardoso

segunda-feira, julho 17, 2006

- onde é que eu te procuro, para além de em mim...?




"Amo-te..."...foi um engano. Adorava-te, sim, do fundo de todo o meu ser, do meu não existir sem ti. Adorava-te, de tal maneira irracional que confundi com o amar, sentimento esse que o nosso mundo hoje desconhece, por ignorância.
Esses casalinhos estupidos (perdoem-me os mesmos) de hoje. Não conseguem continuar sobre a adversidade. "É dificil", já ouvi essa historia, dizem uns deles. Mas nada na vida se mostra facil; como tudo, é somente facil ver o dificil. Olham um para o outro e não procuram um futuro em consonância, mas prosseguem uma prospeção a fazer, a encontrar uma falha qualquer que conduza ao mais belo e "facil!" exterminio de uma relação, acabar de um passado lembrado.
Não, não sabes o que é o amor, sei-o eu. Porque o senti, não por ti, não por mim...talvez por mim mesmo, pela minha vida contigo que tive de suportar, sem o corroer da alma que decidiste começar, sem fim à vista. Por isso, e muito mais, desculpa, tive que te matar; a tua existência teve que morrer em mim. Agora me parece inusitado, tudo o que nós fizemos, porque não conseguiste ver para lá do "sorriso".
Hoje, hoje não há amor. Há momentos de grande paixão. E a chama apagar-se-á com a mais leve das brisas, com o mais fraco suspirar de uma consideração indevida e sem objectivo; uma chama que nos correu na alma, mas que tu não deixaste chegar à fogueira do teu coração...que ninguém, digamos de passagem, esteve toa perto de queimar.
Sou dos poucos especimes desta raça, que "sobrevive" neste vale ventoso que é o mundo de hoje.
Onde é que está o romance? Tudo é uma ligação fisica, um depencia de outro para com outro para si mesmo. Onde é que está o romance? que me pode, que nos pode ajudar a ultrapassar a linearidade? Já não existem aventureiros, rangers da contradição, já não existem. Étudo fácil, tem que o ser. Mas, no meio disto tudo, onde é que está o romance?! se ninguém o procura...
Ninguém perceb, ninguém quer sequer perceber, porque não é algo explicavél. Simples e puro, na sua imensa complexidade, para quem o sente sem razão. Inconcebível, para os que nele pensam por demasia. É a minha teoria.
O romance do momento, deixemo-nos levar por ele, porque recusa cepticismos para com o quão exuberante ele é!
Onde é que está o romance? Não o procures, não o busquem, porque o não vão conseguir encontrar. Está dentro de mim, esconde-se, e não to vou mostrar.
Porque não te amo...





Nuno de Sá Lemos
17/07/2006